O Computador e o Portador de Necessidades Especiais
A informática e o computador podem se tornar grandes aliados do portador de necessidades especiais. Entretanto, precisam ser encarados de forma realista e não como a panacéia para uma problemática, até hoje ainda sem solução.
Uma das vantagens da utilização do computador com uma clientela possuidora de especificidade tão distintas - a instauração de uma situação de aprendizagem na qual não há riscos de bloqueios cognitivos em função de problemas emotivos ou de faltas na capacidade de relacionamento. Segundo Lolline (1991), como subsídio didático, o computador é um animal dócil e paciente. Diferentemente dos seres humanos, não se queixa, não grita e não castiga em caso de erro. O computador se apresenta como uma máquina que repete docilmente o trabalho, responde perguntas, cala-se ao mero comando de uma tecla e obviamente não provoca constrangimentos afetivos durante as situações de aprendizagem propostas.
Além de todos os aspectos já mencionados, o portador de necessidades especiais poder encontrar no computador um maior leque de opções do que as oferecidas pela escola. Pesquisas futuras poderão ratificar a hipótese que dentre os motivos que causam comportamentos alterados podem desaparecer quando o aluno trabalha com uma máquina que não perde a paciência, não julga e não o apressa. Esta máquina não tem como suspirar denotando impaciência, e acima de tudo, este aluno, já tão estigmatizado poder trabalhar e produzir sem o medo da nota ou da comparação, que de maneira geral, acontecem em situações de aprendizagem.
Deficiência Auditiva e Computador
Vários especialistas em problemas cognitivos e linguísticos de deficientes auditivos têm enfocado as relações entre algumas dificuldades cognitivas dos surdos e questões relativas ao desenvolvimento de suas características simbólico-verbais. Fernandes (1990), reportando-se a Myklebust (1964), afirma que as operações mentais mais afetadas pela surdez " são as que requerem facilidade simbólico verbal". Apesar da possibilidade do desenvolvimento de uma linguagem própria, o domínio desta linguagem não seria suficiente para que as crianças surdas pudessem suprir as várias necessidades relativas a ausências de um código simbólico-verbal específico como o usado por qualquer falante normal.
A interação do computador com o surdo poder representar um passo a frente no que diz respeito à educação, porém é preciso que se reconheça a necessidade da interdisciplinaridade para que se possa, de fato, criar e implementar programas que facilitem o aprendizado desta clientela que detém uma gama incrível de especificidades.
No Rio de Janeiro, há experiências no INES (Instituto Nacional de Surdos) que inserem no trabalho pedagógico a Linguagem LOGO. Além disso, pesquisas na área de informática e surdez vêm sendo desenvolvidas em várias Universidades brasileiras, tanto na área de produção de softwares educativos, quanto na área da engenharia Biomédica.
Um exemplo é a pesquisa de Doutorado de Silva desenvolvida na Unicamp, em parceria com a UERJ e UFRJ que pretende o desenvolvimento de um software educativo com o objetivo de facilitar o processo de alfabetização, tendo a língua de sinais como fio condutor.
Deficiência Visual e Computador
Assim como o deficiente auditivo, o deficiente visual já pode utilizar o computador como uma ferramenta a mais em sua vida acadêmica. O sistema operacional DOSVOX, desenvolvido pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade federal do Rio de Janeiro, sob a supervisão do analista José Antonio Borges, permite que pessoas cegas utilizem um microcomputador, através do uso de sintetizador de voz para desempenhar uma série de tarefas, adquirindo assim um alto nível de independência no estudo e trabalho.
Além do DOSVOX, os cegos também podem ter acesso a INTERNET através do DOSVOX/DISCAVOX que é um programa que permite o acesso à Internet através de uma linha telefônica e de um Fax Modem. Os textos vindos da Internet são sintetizados em fala na língua portuguesa, esta infraestrutura viabiliza ao cego a navegação pela rede, uma fonte quase inesgotável de cultura.
Deficiência Física e Paralisia cerebral e Computador
Segundo Henrriques (1990), a terminologia mais correta para definir este quadro seria Encefalopatia Crônica da Infância. Encefalopatia porque a lesão - de toda a massa encefálica que está contida no crânio; crônica porque persiste por toda a vida e da infância porque pode se apresentar desde o nascimento até - os três anos de idade.
Em função da desinformação sobre o que é a paralisia cerebral, o portador desta deficiência é, muitas vezes, tratado como portador de deficiência mental e/ou física. A paralisia cerebral atinge áreas do cérebro responsáveis pelo movimento e equilíbrio das pessoas, podendo ainda provocar alterações de fala, audição, fala, visão, percepção, comportamento, além de crises convulsivas e deficiência mental. Deste modo, os portadores de paralisia cerebral podem apresentar alterações neuro-musculares que se evidenciam por um quadro de espasticidade (rigidez) ou por um quadro de hipotonia (flacidez), com movimentos descoordenados, com dificuldade de pegar objetos, falta de equilíbrio e, às vezes, com outros distúrbios associados como cegueira, surdez, deficiência mental, etc.. Todo este quadro clínico - variável e diverso e deve-se a uma lesão do encéfalo, antes, durante e/ou após o parto, provocada por infecções como menigite, encefalite, distúrbios respiratórios graves, traumatismos, desnutrição, etc.
A informática parece ter caminhado bem mais rapidamente na área da medicina do que na área educacional, no que se refere à reabilitação e a facilitação da vida social do deficiente físico e do portador de paralisia cerebral. Entretanto, pode-se, também, inferir que esta clientela em muito se beneficia, no campo educacional, com a inserção do computador em sua vida escolar.
Crianças com dificuldade de pegar um lápis devido a paralisias podem utilizar o teclado, seja para escrever, desenhar ou colorir, e, com o computador, a produção e ilustração de textos torna-se mais estética. Além disso, para os portadores de problemas motores o desenho é quase sempre tarefa muito árdua. Ilustrar um texto com o ferramental disponível no computador para aqueles portadores desta dificuldade torna-se um feito artístico e estético.
Para o portador de paralisia cerebral a experiência educativa com o computador significa a oportunidade de desenvolver atividades desafiantes tanto no campo educacional quanto no de diagnóstico. Além disso, a grande maioria das experiências demonstram que o trabalho pedagógico apoiado pela informática propicia uma compreensão mais profunda da capacidade intelectual da criança por sobrepujar a deficiência ao ser capaz de uma produção mais estética.
No Brasil, várias universidades públicas (UFRJ/UERJ/UNICAMP/UFRGS) desenvolvem pesquisa nesta área. Também, algumas secretarias de educação já possuem programas de informática aplicada à educação específicos para esta clientela, entre elas, podemos citar a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro.
Autismo
É necessário frisar que estas crianças possuem um perfil bastante idiossincrásico, o que em muito dificulta o processo pedagógico. Embora haja uma grande dificuldade em se obter diagnósticos precisos, vale ressaltar que estas crianças costumam apresentar algumas e até muitas das seguintes características: (a) não se misturam com outras crianças; (b) agem como se fossem surdas; (c) resistem ao aprendizado; (d) não demostram medo de perigos reais; (e) resistem a mudanças de rotina; (f) usam pessoas como ferramentas; (f) têm risos e movimentos não apropriados; (g) resistem ao contato físico; (h) têm acentuada hiperatividade física; (i) não mantém contato visual; (j) têm apego não apropriado a objetos; (k) giram objetos de maneira bizarra e peculiar; (l) as vezes são agressivos e destrutivos; e (m) apresentam modo e comportamento indiferente e arredio.
A idiossincrasia comportamental dos portadores desta Síndrome têm, sistematicamente, os afastado dos bancos escolares. A impossibilidade de relação com o meio-ambiente torna o autista um cidadão alijado do processo educacional.
A fortaleza intransponível refletida pelo mundo autista poder encontrar no computador um aliado. Algumas experiências apontam para a possibilidade de integração entre estas crianças e a máquina. O computador abre, assim, uma porta de entrada para este mundo tão desconhecido. Serão necessários, ainda, muitos anos de tentativas para que se obtenham respostas.
Por todos estes motivos não há como se alijar o computador do processo ensino-aprendizagem. Ao analisarmos o progresso da Informática, podemos concluir o quanto esta é uma ciência abrangente e dinâmica, uma vez que, além de combinar aplicações de todas as áreas do conhecimento, seus usos são praticamente ilimitados.
Para finalizar, é fundamental que se ressalte que cada indivíduo portador de necessidades educativas especiais é um universo ainda muito desconhecido para aqueles que organizam e implementam programas educacionais; se faz necessário uma abordagem multidisciplinar/interdisciplinar e muita humildade para admitir que ou muito pouco se conhece no campo das necessidades educativas especiais.
Os resultados destas experiências apontam tanto para a possibilidade de inclusão do portador de necessidades educativas especiais em turmas regulares, quanto para a inesgotável possibilidade de uso da informática no cotidiano escolar. Entretanto, vale ressaltar que tanto a inclusão do portador de necessidades educativas especiais quanto a inserção de novas tecnologias no cotidiano escolar vão depender da instrumentalização do professor para resgatar a intencionalidade de sua prática, a dimensão social da mesma e fundamentalmente uma tomada de consciência de seu próprio fazer pedagógico.
Vale a pena reiterar que a mera inserção de novas tecnologias no cotidiano escolar não garantirá a melhoria da qualidade de ensino, assim como a mera " inserção" do portador de necessidades educativas especiais em escolas regulares não garantirá uma presente e certamente futura exclusão social desta clientela.
Inclusão x Inserção
A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 aponta para a inclusão em escolares regulares do portador de necessidades educativas especiais, mas, também, assegura o atendimento educacional em classes, escolas ou serviços especializados sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. (LDB,1996).
A inclusão de crianças portadoras de necessidades especiais no sistema regular de ensino é possível desde que sejam considerados, entre outros, alguns dos seguintes aspectos: (a) grau de comprometimento das crianças especiais a serem inseridas em turmas regulares; (b) atendimento multidisciplinar; (c) preparação dos profissionais de ensino; (d) condições físicas das escolas; (e) número de crianças por turma; (f) recursos materiais; (g) visão interdisciplinar do currículo.
Segregar crianças severamente comprometidas para um atendimento mais individualizado na primeira infância pode se tornar um fator de integração social futura; além disso, há crianças que dificilmente serão incluídas no processo educacional regular em função de sua atipicidade comportamental o que demandará da educação especial a busca de alternativas educacionais específicas para esta ou aquela forma de atendimento.
A inclusão/integração não é, portanto, uma panacéia a ser aplicada indistintamente em toda e qualquer criança. A escola precisa saber o seu potencial de atuação para que não se comporte de forma demagógica com relação a estas crianças.
A mera inserção de crianças portadoras de necessidades educativas especiais em turmas/ escolas regulares não garante a inclusão, de fato, destas crianças no processo educacional. É necessário que não se paralise frente as diferenças, mas também torna-se fundamental que se redesenhe o papel da escola. Para tanto, o respeito às diferenças e às diferentes falas devem estar presentes no cotidiano escolar. Inserir todos estes aspectos na prática pedagógica demandará do educador uma postura crítica frente a inclusão destas crianças, assim como exigirá do educador a intencionalidade de sua prática. Incluir significa muito mais do que inserir. Não podemos mais ser reféns de posturas ideológicas que em muito pouco contribuem para a qualidade da educação. Incluir - sim - sempre que for possível, incluir, sim, sempre que esta inclusão signifique melhoria da qualidade de vida do indivíduo e, desta forma, contribua para a sua real inclusão social, garantindo-lhe sua cidadania plena.
* Referências Bibliográficas
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* Angela Carrancho da Silva - Doutoranda em Educação - UNICAMP
Mestre em Educação - UFRJ
Assistente da Divisão de Midia Educação da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro
Professora da Faculdade de Educação da UERJ
Coordenadora do Programa de Pos-graduação em Informática aplicada a
Educação das Faculdades Integradas SIMONSEN